Os Asurini do Xingu são uma comunidade indígena que habita a região entre os rios Xingu e Bacajá, no Pará. Conhecidos por sua resistência, arte e forte ligação com a natureza, esses indígenas enfrentaram desafios históricos intensos, desde conflitos com outros povos até o contato devastador com frentes de exploração e a sociedade não indígena.
A seguir, vamos explorar a rica história e cultura dos Asurini do Xingu, destacando sua origem, mitologia, modo de vida e sua luta pela preservação de seu território e tradições.
Origens
O nome Asurini tem diversas interpretações e foi atribuído ao grupo de diferentes maneiras ao longo da história. Segundo o etnógrafo Curt Nimuendajú, o termo "Asurini" significa "vermelho" na língua Juruna (1963c), provavelmente devido ao uso abundante de urucum pelos indígenas para tingir seus corpos. Esse nome foi utilizado de forma genérica para se referir a vários grupos indígenas que habitavam a região entre os rios Xingu e Bacajá. Além disso, diferentes etnias deram nomes variados aos Asurini. Os Kayapó, por exemplo, chamam-nos de Kub(ẽ)-Kamrég-ti, que também significa "índio vermelho".
Internamente, os Asurini se autodenominam Awaeté, que significa "gente de verdade". Esse nome carrega um forte simbolismo, destacando a importância de sua identidade e cultura em um mundo em que a preservação de sua maneira de viver está constantemente sob ameaça.
A Língua e a preservação cultural
Os Asurini do Xingu falavam uma língua pertencente à família linguística Tupi-Guarani, classificada por Aryon Rodrigues no subgrupo V, ao qual também pertence a língua Kayabi. Embora os Asurini tenham sofrido grandes impactos após o contato com os colonizadores, sua língua e cultura conseguiram sobreviver e continuam sendo transmitidas para as novas gerações. Um marco importante foi a publicação de uma gramática Asurini em 1998, elaborada pela linguista Ruth Monserrat com o apoio do CIMI (Conselho Indigenista Missionário). Essa gramática tem sido utilizada nas escolas da aldeia Koatinemo, localizada na Terra Indígena homônima, oficializada em 1986.
A continuidade da língua entre os Asurini reflete a resistência cultural do grupo. Enquanto muitas comunidades indígenas enfrentam o desafio da perda de suas línguas, os Asurini permanecem bilíngues, com a maioria dos indivíduos abaixo de 40 anos fluentes tanto em sua língua nativa quanto em português.
Território e localização
A aldeia dos Asurini do Xingu está situada à margem direita do rio Xingu, na Terra Indígena Koatinemo, uma área de importância vital para o sustento da comunidade. O território dos Asurini inclui roças, locais de caça, pesca e coleta, localizados entre os rios Xingu, Piranhaquara e Igarapé Ipiaçava. Essas áreas fornecem os recursos naturais necessários para a subsistência do grupo e são essenciais para a continuidade de sua cultura.
Durante o século XX, os Asurini enfrentaram intensos conflitos territoriais, muitas vezes forçados a se deslocar de suas terras devido a ataques de outros grupos indígenas, como os Kayapó e os Araweté, e a invasão de brancos em busca de recursos naturais. Em 1986, a Terra Indígena Koatinemo foi finalmente homologada, garantindo aos Asurini um território oficial, embora os desafios de proteção e defesa desse espaço continuem até hoje.
População e desafios demográficos
A população dos Asurini sofreu grandes perdas ao longo dos séculos, principalmente devido a confrontos com outros povos e às doenças trazidas pelos brancos durante o contato no século XX. Em 1930, a população Asurini era estimada em 150 pessoas. No entanto, após o contato, muitos membros da comunidade foram dizimados por doenças como gripe e malária, que até então eram desconhecidas pelos indígenas e para as quais eles não tinham imunidade.
O número de Asurini caiu para cerca de 52 pessoas em 1982, mas desde então a população vem se recuperando gradualmente. Em 2002, o grupo contava com 106 indivíduos, uma recuperação atribuída ao aumento da taxa de natalidade e a mudanças nos padrões familiares, incluindo casamentos interétnicos.
O contato com os brancos e suas consequências
As primeiras menções aos Asurini datam do final do século XIX, com registros de ataques indígenas nas margens do rio Bacajá, atribuídos aos Asurini. Entre 1894 e 1896, esses ataques foram relatados por cronistas estrangeiros, como Condreau (1977), e evidenciaram os conflitos que surgiram com a chegada dos brancos à região.
No entanto, foi na década de 1970 que os Asurini tiveram seu contato mais significativo com a sociedade não indígena, principalmente devido à construção da Rodovia Transamazônica e à presença de empresas multinacionais interessadas nos recursos naturais da região, como a United States Steel-CVRD. O contato foi organizado por frentes de atração da Funai e por missionários católicos, como os irmãos Anton e Karl Lukesch.
Infelizmente, esse contato trouxe consequências devastadoras para os Asurini. A falta de medidas preventivas contra doenças e a aproximação desorganizada resultaram em uma violenta epidemia de gripe e malária que dizimou parte significativa da população. A epidemia não apenas enfraqueceu fisicamente o grupo, mas também abalou sua organização social, levando à morte de muitos dos líderes mais velhos, essenciais para a coesão e estabilidade da comunidade.
Cultura e modo de vida
A cultura dos Asurini é profundamente enraizada em sua relação com a natureza e suas tradições. Suas atividades econômicas giram em torno da agricultura, da pesca, da caça e da coleta. A mandioca é o alimento base de sua dieta, transformada em farinha de diversas maneiras. Outros alimentos incluem milho, batata-doce, cará e frutas como melancia e banana.
A cultura material dos Asurini também é um aspecto central de sua identidade. A cerâmica, por exemplo, é uma das expressões mais importantes de sua arte. As mulheres são responsáveis pela fabricação de potes e outros utensílios de barro, decorados com motivos geométricos que refletem elementos da natureza e figuras mitológicas. A pintura corporal e a decoração de cabaças e arcos também fazem parte de um sistema de arte gráfica que transmite significados sociais e espirituais.
A moradia tradicional dos Asurini é a aketé ou tavywa, uma grande casa comunal de formato retangular, onde vivem diferentes grupos domésticos. Nessas casas, não apenas se vive, mas também se realizam cerimônias importantes, e os mortos são enterrados sob o chão da habitação.
O Sistema Xamânico e Espiritualidade
O xamanismo é uma prática central na vida dos Asurini. Os xamãs, chamados de pa(z*)é, desempenham um papel crucial na manutenção da saúde espiritual e física da comunidade. Eles realizam rituais para invocar espíritos e curar os doentes, estabelecendo uma conexão direta entre o mundo físico e o espiritual.
Um exemplo emblemático dessa prática foi o processo de iniciação de Boaiwa, um jovem que, após relatar visões do espírito da onça (Tiwá), passou por uma série de rituais para se tornar xamã. Esses rituais, que incluíram jejuns, danças e o uso de charutos, são parte do aprendizado necessário para dominar os espíritos e garantir a proteção da comunidade.
Os Asurini do Xingu são um povo de grande resiliência, cuja história reflete tanto os desafios do contato com o mundo exterior quanto sua forte determinação em preservar sua cultura e modo de vida. Sua rica tradição artística, espiritualidade e luta pela sobrevivência continuam a inspirar todos aqueles que buscam conhecer e apoiar as causas indígenas no Brasil.
Apesar dos desafios enfrentados ao longo dos séculos, os Asurini mantêm vivas suas tradições, transmitindo suas histórias, língua e arte de geração em geração. Eles são um exemplo de resistência e preservação cultural em um mundo que constantemente ameaça suas raízes e modos de viver.
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